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Com as recentes rodadas de partilha empresas como a Shell, Total, ExxonMobil e a CNOOC, passam a assumir um papel mais importante no mercado brasileiro de petróleo e gás. Ao longo dos próximos anos, essas e outras petroleiras passarão a responder por uma parte cada vez maior da produção nacional de óleo e gás. O setor agora tem um rumo mais claro, com o fim da operação exclusiva da Petrobras no pré-sal, a programação de leilões, e a definição de programas para o refino, gás natural (“Gás para Crescer”), e biocombustíveis (“RenovaBio”).

Contudo, para gerar mais investimentos, ainda precisamos atacar as imprescindíveis reformas estruturais: simplificar o sistema tributário e a legislação trabalhista, promover uma verdadeira “revolução” educacional, garantir segurança e estabilidade jurídica, sem o que os efeitos positivos dos programas setoriais não são sustentáveis.

Um outro aspecto importante na avaliação do investidor é a efetividade da Justiça, ou seja, em caso de quebra de contrato, a qualidade do sistema judiciário para se resolver uma disputa. Em recente Relatório “Justiça em números”, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), vimos que a execução de uma decisão no Brasil leva em média quatro anos e seis meses, enquanto o processo de tomada de decisão leva um ano e quatro meses, ou seja, um prazo absurdo que não coaduna com a urgência do mundo dos negócios.

Por essa razão, as grandes empresas e a própria Administração Pública têm optado por métodos alternativos de resolução de conflitos (“ADRs”), como a arbitragem e a mediação. É natural que o setor público busque métodos mais ágeis e técnicos, pois figura hoje no polo ativo ou passivo em mais da metade dos processos em curso no Brasil!

Apesar de garantir maior imparcialidade, rapidez e tecnicidade na solução de controvérsias, a arbitragem possui natureza adversarial e tem custo elevado. Assim como no judiciário, a decisão declara um vencedor e um perdedor, com o consequente rompimento ou desgaste da relação entre as partes. Por esse e outros motivos, é comum a utilização de métodos consensuais como a mediação e o dispute boards em contratos no setor de petróleo e energia, em todo o mundo.

O atual Código de Processo Civil, vigente desde março de 2016, incentiva o uso dessas técnicas, ao prever, em seu artigo 3º, que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos devem ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. Antes disso, a Resolução 125/10, do CNJ, já havia institucionalizado a autocomposição como política pública, e a Lei de Mediação (13.140/15) reforçado o marco legal.

O setor de petróleo e gás, além de ser regulado, tem características peculiares: poucos players que se relacionam de forma muito próxima, contratos de longo prazo, complexidade tecnológica, altos riscos e custos. Em caso de impasse contratual, é muito raro que as partes não consigam negociar e equacionar os problemas, pois já têm uma postura colaborativa em função da natureza das atividades desenvolvidas.

Mas as negociações diretas podem falhar, e nesse caso, a mediação é um método muito vantajoso para resolver conflitos nesse setor. O mediador conduz as partes a “pensar fora da caixa”, buscando soluções criativas, ganha-ganha, inimagináveis em um procedimento adversarial. O processo é ágil, eficaz, pouco oneroso, e a resolução do conflito pode ocorrer em poucas reuniões, em um curto espaço de tempo, possibilitando que as partes mantenham e até fortaleçam seu relacionamento. A maior vantagem do procedimento é promover soluções das diferenças em bases mutuamente aceitáveis, preservando os benefícios comerciais da relação. Quanto custa interromper uma plataforma de produção ou uma refinaria? É evidente que o tempo é crucial na resolução desses impasses, bem como o sigilo, para não prejudicar os negócios e, inclusive, o valor de ações em bolsa.

Importante considerar os contratos com a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) e as minutas-padrão de editais e contratos da Petrobras. Seguindo as boas práticas de governança pública, deve-se buscar a eficiência da Administração, tornando-se urgente que as práticas de soluções consensuais sejam também aplicadas em âmbito público. Os princípios do acesso efetivo à justiça, a duração razoável do processo e a eficiência, indicados em nosso texto constitucional, devem nortear os agentes públicos, reforçando a importância dos métodos consensuais.

Nesse diapasão, a ANP promoveu uma Audiência Pública, no último dia quatorze, com o propósito de melhorar a cláusula arbitral nos contratos de exploração e produção, que já preveem cláusula de conciliação e arbitragem, de forma escalonada.

O momento é oportuno para que a ANP faça a adequação dessa cláusula à luz do marco legal da mediação, com a substituição do instituto da conciliação pelo da mediação, por ser o método mais adequado à resolução de controvérsias nesse tipo de contrato. Importante observar que o mediador deve ser um terceiro neutro, e não um agente da própria ANP, sob pena de descaracterizar o procedimento, que pressupõe total imparcialidade do mediador.

Da mesma forma, a Petrobras, maior operadora do país, também deveria adotar o instituto da mediação em seus contratos com particulares e com parceiros comerciais. A estatal hoje busca padronizar as suas minutas de editais e contratos, em obediência ao novo sistema de compras e contratações que passa a vigorar no ano que vem, sob a égide da Lei 13.303/16. Que tal aproveitar a oportunidade para incluir a mediação como procedimento prévio de resolução de controvérsias nos seus contratos? Cláusulas escalonadas mediação e arbitragem (med-arb) ou cláusula escalonada mediação-judiciário (med-jud) seriam muito bem-vindas no mercado. Afinal, que empresa atuante no setor tem interesse em romper o relacionamento com a Petrobras?

Nos termos da legislação em vigor, havendo cláusula de mediação, as partes devem obrigatoriamente comparecer à primeira reunião – o que é um grande passo rumo ao acordo – mas não são obrigadas a permanecer em procedimento de mediação, resguardado o princípio da autonomia da vontade das partes.

O mundo passa por rápidas e urgentes mudanças e o Brasil não pode ficar para trás. A democratização da resolução de conflitos é um fenômeno mundial, em que as pessoas e empresas reassumem a responsabilidade pela resolução de suas questões. A sentença, ainda que favorável a uma parte, nunca é a solução mais apropriada e integral para um impasse complexo. O Brasil possui um marco legal de boa qualidade e condições de se tornar um exemplo na área de resolução consensual de conflitos. Impõe-se, no entanto, que haja uma mudança de mentalidade dos administradores, executivos, advogados, juízes, agentes públicos e da sociedade como um todo, quebrando dogmas, afastando-se a cultura resistente que valoriza a polarização e o embate, abrindo espaço para processos colaborativos, que ao final geram mais resultados positivos e satisfação para todos.

Fonte: TN Petróleo

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